UNIDADE TEMÁTICA: Conteúdos e Procedimentos Didático-metodológicos para a Educação Infantil
ROTEIRO DE ESTUDO: Necessidades Educacionais Especiais e as Práticas Pedagógicas para a Educação Inclusiva: das pessoas com deficiência sensorial
Uma conversa sobre pessoas ‘especiais’
“Não há nada na nossa inteligência que não tenha passado pelos sentidos”. (Aristóteles)
Se buscarmos, em nossa memória, as experiências que vivemos em nosso processo educacional no contexto escolar, observaremos que foram poucas aquelas relacionadas ao uso integrado dos sentidos ou até mesmo ao uso de um deles. A interação por meio dos sentidos não faz parte da nossa cultura educacional. Aparentemente esquecemos que, ao nascer, a capacidade de percepção por meio dos sentidos encontra-se bastante desenvolvida. Assim, com poucas horas de vida, o recém-nascido reconhece a sua mãe pelo olfato ou pela audição. Entretanto, os sentidos serão ainda aperfeiçoados com base nas experiências e na maturação biológica. Legarda e Miketta (2008, p. 20) destacam três aspectos importantes e que estão relacionados aos sistemas sensoriais:
1) o uso integrado que fazemos dos sentidos em nossos primeiros anos de vida vai decrescendo com o passar dos tempos, devido à desvalorização da acuidade sensorial em nossa cultura e sistema educativo. Lamentavelmente, os currículos de estudo de crianças com mais de seis anos descuidam, quase que completamente, desse importante aspecto do desenvolvimento, que não se restringe apenas a uma forma de conhecer o meio ambiente, mas é também uma maneira de conhecermos a nós mesmos;
2) os sentidos são nossa primeira fonte de conhecimento. No nascimento, não há o pensamento simbólico e nem o raciocínio lógico, somente o mundo sensorial e perceptivo. Assim sendo, estímulos variados são fundamentais nos primeiros anos de vida;
3) nós, humanos, mostramos diferenças em nossos padrões sensoriais e em nossa capacidade de aprender por meio de um ou outro sentido, ou seja, alguns utilizam melhor a visão, outros a audição. Possuímos seis sistemas sensoriais com os quais conhecemos e nos relacionamos com o mundo: gustação, olfato, tato, audição, visão e propriocepção. Apresentaremos cada um desses sentidos de forma resumida, visto que já refletimos sobre eles em alguma etapa de nossa formação.
Os Sentidos:
A gustação
O sentido do paladar ou gustação encontra-se nos receptores localizados na língua, as papilas gustativas. Esse sentido distingue quatro sabores básicos: amargo (parte posterior da língua); azedo e salgado (bordas da língua); doce (ponta da língua). A gustação é o nosso sentido mais fraco, devido a língua ter de cumprir outras funções como articular a fala, por exemplo.
O Olfato
O sentido do olfato funciona com quimiorreceptores localizados no nariz e que captam as substâncias voláteis dispersas no ar. Há uma estreita relação entre gustação e olfato, o que pode ser experimentado cheirando e degustando ao mesmo tempo um pedaço de bolo. Existe uma associação entre o olfato e as lembranças. Legarda e Miketta (2008) destacam que talvez esta relação tenha um fundo adaptativo e que em algum momento essa associação nos protegeu de predadores e alimentos venosos, entretanto, hoje essa associação é pouco explorada no contexto pedagógico.
O Tato
Nabuco e Cortez (2005) destacam que o tato é um dos primeiros sentidos a amadurecer. O sentido do tato tem seus receptores na pele, onde há células especializadas para a percepção do calor, do frio e da dor. Esse sentido, conforme Legarda e Miketta (2008) é importante no desenvolvimento emocional, no conhecimento do corpo e na formação de vínculos afetivos.
A Audição
Antes de nascer, o bebê é capaz de ouvir. Ouve os batimentos cardíacos da mãe, os sons da respiração e da digestão. Ainda no ventre é capaz de reagir a estímulos sonoros direcionados ao ventre e quando nascem apresentam preferência por canções ouvidas durante a gestação, fato que demonstra a presença de memória auditiva. O sentido da audição tem seus receptores no ouvido, conforme ilustração acima.
A Visão
Nabuco e Cortez (2005) esclarecem que, no início, os recém-nascidos enxergam apenas borrões. Entre a 4ª e 6ª semana de vida, passam a fixar o olhar em objetos, uma vez que se completa a formação da região da retina que permite visualizar detalhes. A partir dos 2 meses, as imagens que eram acinzentadas ganham matizes de vermelho, branco e azul. A visão evolui rápido, de modo que ao completar 4 meses a criança já distingue as demais cores e segue os objetos com os olhinhos. O pequeno começa a focar as mãos e a brincar com elas. O passo seguinte é apanhar os objetos que vê. Posteriormente, passa a reconhecer as pessoas e estranham rostos e locais diferentes. Geralmente, até os 5 anos a criança atinge o desenvolvimento total da visão.
A Propriocepção
Legarda e Miketta (2008, p 19) definem esse sentido como sendo "aquele que sobre a localização de uma parte móvel do corpo, a mão por exemplo, em relação a outra de posição fixa, como o tronco". Dutra (2007) destaca que a propriocepção acontece por meio de diversos sensores específicos espalhados pelo corpo, que reconhecem as mudanças de posição e do movimento. Durante uma corrida, por exemplo, nosso corpo muda de posição centenas de vezes e os mecanismos de controle da propriocepção são muito exigidos. A propriocepção nos ajuda a manter posição adequada em uma cadeira, segurar utensílios tais como uma caneta ou garfo de maneira adequada, julgar como manobrar no espaço de modo a não bater nas coisas, a que distância temos de estar das pessoas para não ficarmos perto demais, quanta pressão colocar para evitar quebrar um lápis ou um brinquedo e a mudarmos as ações que não foram bem sucedidas tais como jogar uma bola em um alvo. Como a propriocepção nos ajuda com funções tão básicas, um problema nesse sistema pode nos causar bastante dificuldade. O que geralmente acontece é que a criança tem de prestar atenção em coisas que deveriam acontecer automaticamente. O sistema proprioceptivo é ativado por intermédio de atividades de puxar, empurrar, pular e atividades que envolvem peso e pressão firme ou toque profundo. Esse tipo de sensação geralmente é calmante e pode ser útil para a criança que se desorganiza facilmente. Até aqui realizamos uma apresentação suscinta sobre cada um dos sentidos, mas é importante pensarmos na possibilidade de um ou mais de um deles não funcionar ou apresentar-se prejudicado, diminuído, como os casos de alunos com baixa visão, alunos que apresentam surdez, alunos cegos, alunos com múltiplas deficiências sensoriais ou ainda aqueles que apresentam surdo-cegueira. Essa será nossa próxima reflexão, ou seja, levando em consideração os casos específicos apresentados, como trabalhar a estimulação sensorial em uma perspectiva inclusiva? É importante refletirmos: e quando falta um ou mais de um sentido? Esse questionamento guiará nossas próximas discussões. E quando falta um ou mais de um sentido? Etnocêntricos que somos, não nos damos conta da percepção do mundo pelo uso integrado de todos os nossos sentidos. O fato de não apresentarmos nenhuma deficiência sensorial, geralmente, nos impede de perceber a importância de todos os sentidos e nos leva a supervalorizar apenas um deles, como a visão, por exemplo. No início desse texto, comentamos que a utilização de todos os sentidos não é comum em nosso dia a dia na escola, principalmente quando lidamos com crianças maiores de seis anos de idade. Entretanto, no atual contexto educacional, em que discutimos a educação na perspectiva inclusiva, percebemos a necessidade de refletirmos sobre a estimulação sensorial, considerando não somente as necessidades educacionais especiais, mas principalmente o fato de que estimular os sentidos traz benefícios para todos os alunos. Você já parou para observar uma pessoa com deficiência visual? Um primeiro contato com uma pessoa cega, geralmente, é suficiente para que ela retenha na memória a sua voz, reconheça-lhe pelo toque ou talvez pelo seu perfume. Isso não significa que a pessoa com deficiência visual seja um ser extraordinário, como muitos consideram. Significa que ela entra em contato com o mundo e com os outros por meio dos sentidos remanescentes, isto é, os sentidos que permanecem preservados. Sentidos estes que se tornam aguçados, pelo fato de serem estimulados e que favorecem a interação do sujeito com o meio. Em relação às pessoas com baixa visão, aquelas com visão reduzida e cuja deficiência não é corrigível por lentes, cirurgias ou tratamento, inúmeras pesquisas comprovam que a estimulação da visão residual favorece o ganho de eficiência na utilização da visão preservada. Entretanto, há casos em que uma perda visual severa exige da pessoa o uso integrado de mais de um sentido, como a visão associada ao tato, por exemplo. As pessoas com surdez, por sua vez, são extremamente visuais, o que favorece o domínio de uma língua visual-espacial. Também é importante considerar as pessoas que apresentam resíduo auditivo e que, portanto, carecem de estímulos dessa natureza. Mais complexos do que todo o exposto até aqui, são os casos de surdo-cegueira e deficiências múltiplas. A surdo-cegueira é uma deficiência única que apresenta a perda da audição e visão de tal forma que a combinação das duas deficiências impossibilita o uso dos sentidos de visão e audição e cria necessidades especiais de comunicação. A interação pelo toque, nos caos de surdo-cegueira, é fundamental para acessar informações e compreender o mundo. Já a múltipla deficiência sensorial é a deficiência auditiva ou a deficiência visual associada a outras deficiências (intelectual e/ou física), bem como a distúrbios (neurológico, emocional, de linguagem ou no desenvolvimento global) que podem acarretar atrasos no desenvolvimento, devido às dificuldades de interação com o meio. Apresentamos limitações e possibilidades em relação às pessoas que apresentam deficiências sensoriais. Entretanto, conforme Omote (1994, p. 69), não se justifica uma teoria que apenas explique como as pessoas deficientes funcionam, mas, o importante é explicar como as pessoas em geral lidam com as diferenças, especialmente aquelas às quais o grupo social atribui algum significado de desvantagem e descrédito social. Nesse sentido, como poderíamos pensar em práticas pedagógicas relacionadas às necessidades educacionais especiais, especificamente as deficiências sensoriais? Partindo desse questionamento, apresentaremos reflexões sobre a prática pedagógica e tentaremos justificar o porquê de termos iniciado nossa discussão abordando o uso dos sentidos.
Práticas pedagógicas: necessidades educacionais especiais – deficiências sensoriais – educação inclusiva
Magalhães (2001) afirma que a Educação Inclusiva propõe uma escola que possa atender às demandas de sua clientela, possua ou não necessidades educativas especiais, seguindo os princípios da democratização do ensino, uma escola que esteja apta a trabalhar com o aluno real. Para tanto, ainda conforme Magalhães (2001), é de suma importância discutir a prática pedagógica: metodologias de ensino, formas de avaliação, currículos formais e ainda as interações cotidianas estabelecidas entre professores, alunos e outros profissionais da escola. Portanto, matricular a criança com necessidades educacionais especiais na escola regular e garantir sua frequência, não garante a sua inclusão, pois incluir pressupõe mudanças de valores e atitudes, e envolve transformações dos padrões curriculares da escola que tradicionalmente reforçam os estigmas associados às pessoas com deficiência. Magalhães (2001), inspirada em SaintLaurent (1997) acrescenta que a inclusão escolar supõe práticas pedagógicas diferenciadas, baseadas na noção de que ao educador cabe desenvolver o seu trabalho a partir das condições efetivamente existentes na clientela atendida, como já explicitado no início deste parágrafo. A concepção de prática pedagógica diferenciada e inclusiva encontra-se ancorada na tese de que a heterogeneidade dos alunos precisa ser respeitada. Nesse sentido, Magalhães(2001) defende a contribuição do multiculturalismo como perspectiva teórica e prática na construção da educação inclusiva. Para definir o termo, a autora se baseia em Moreira e Canen (1999, p.14 que definem cultura como: conjunto de prática por meios das quais significados são produzidos e compartilhados em um grupo". Nesse sentido, a falsa idéia de homogeneidade não tem lugar no contexto escolar, trata-se de um mito, pois a diversidade é característica de todo ser humano, independente de apresentar ou não alguma deficiência. Pensar a Educação Inclusiva pressupõe repensar e até mesmo redefinir a nossa prática, ou seja, não é possível conceber os alunos como iguais, avaliá-los com os mesmos instrumentos, esperar os mesmos resultados, utilizar as mesmas estratégias com todos, impor a nossa maneira de perceber e interpretar os fatos, conceber o currículo com uma estrutura rígida e definitivamente pré-definida, alienado da realidade do aluno. Faz-se necessário respeitar e valorizar a diversidade no contexto educacional. Somos nós, pessoas sem deficiência, que sistematizamos o ensino e já estamos habituados a basear nossas práticas pedagógicas no tradicionalismo, na abstração e na superficialidade. Acreditamos que nossos alunos aprendem assim, porque foi assim que nós aprendemos e também assim nos ensinaram a ensinar, mas a proposta da interação em todos os sentidos e da vivência de experiências reais de aprendizagem são apresentadas aqui como formas de provocar uma reflexão crítica, um olhar crítico sobre a nossa prática cristalizada. Independentemente da condição de apresentar ou não uma deficiência sensorial, em uma pesquisa recente, discutimos a necessidade de criar oportunidades na escola para que todos os alunos possam desenvolver seus sentidos por meio da vivência de experiências significativas: que eles possam cheirar e conhecer os diversos aromas existentes no nosso dia a dia; que os alunos toquem: os objetos, os elementos da natureza; as pessoas, pois o toque também é um tema evadido da sala de aula; que possam explorar a diversidade de sons presentes no nosso cotidiano; que experimentem a riqueza do gosto pelo paladar; que possam associar seus sentidos e explorar situações reais de aprendizagem dentro e fora da sala de aula. É importante que abandonemos nossa concepção etnocêntrica de visão e adotemos uma concepção de visão como um múltiplo, em que é possível ver, sentir e conhecer com o corpo todo, esta é a interação em todos os sentidos e não apenas utilizando a visão (ALMEIDA, 2008, pp. 174, 175).
>>>Segue abaixo a atividade realizada neste Roteiro de Estudos...
Explicaríamos para os pais dessa criança que em relação às pessoas com baixa visão, aquelas com visão reduzida e cuja deficiência não é corrigível por lentes, cirurgias ou tratamento médico, inúmeras pesquisas comprovam que a estimulação da visão residual favorece o ganho de eficiência na utilização da visão preservada. Entretanto, se o caso for mais especial ainda, em que a perda visual é severa, isso exigirá da criança o uso integrado de mais de um sentido, como a visão associada ao tato, por exemplo.Diríamos ainda aos pais, que na escola ou até mesmo em casa, podem ser feitos vários estímulos para a utilização dos demais sentidos sensoriais, como o tato, o olfato e principalmente a audição. A criança com baixa visão pode reconhecer a voz de quem convive com ela, reconhecer até pelo perfume ou pelo simples fato de um barulho diferente notar que não está no seu ambiente habitual por exemplo. É importante estimular bastante esses outros sentidos de crianças com baixa visão, por meio de objetos, brinquedos, contato com diversas pessoas, aromas, sabores, sons e outros meios, para que a criança possa de certa maneira sentir e viver a vida da mesma forma que outra criança, mas por meios diferentes. Pra finalizar, diríamos os pais que juntos: família/escola/professor nesse caso, devemos perceber as necessidades e praticar a estimulação sensorial, considerando não somente as necessidades educacionais especiais, mas principalmente o fato de que estimular todos os sentidos traz benefícios para todos os alunos e principalmente para aqueles que mais precisam se interar com o meio em que está inserido.
Conclusão pessoal dos estudos realizados desta unidade e roteiro de estudo:
Após serem realizadas as leituras recomendadas tenho maior consciência referente às reflexões sobre a relação existente entre práticas pedagógicas, educação inclusiva e deficiências sensoriais. Posso agora refletir com mais clareza sobre a utilização dos sentidos para conhecimento e relacionamento com o mundo. E ainda, valorizar o desenvolvimento da acuidade sensorial no sistema educativo.
O amor e o carinho dos pais pode superar todos os obstáculos presentes
na vida de uma criança especial!!!